Os pais de uma jovem que morreu após tirar um dente do siso pedem a criação de um protocolo que oriente sobre este tipo de procedimento. A família abriu uma petição pública, que já conta com mais de 57 mil assinaturas, direcionada ao Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP).
Isadora Bellon, 18 anos, morreu em 23 de abril, quatro dias após extrair o dente do siso. Ela morava com os pais, Grasiela e Ricardo Albanese Bellon, em Porto Feliz (SP). Os pais afirmam que a falta de um protocolo que oriente sobre o procedimento faz com que cada dentista se baseie no que considera mais adequado para cada caso.
O CROSP informou que tem ciência sobre o abaixo-assinado e se solidariza com a família de Isadora. O conselho explicou que apura denúncias e fiscalizações, porém, não é atribuição do órgão a criação de protocolos (veja a resposta completa abaixo).
“O Conselho reforça que todos os protocolos da Odontologia são fundamentados na Ciência, preconizados na literatura odontológica e utilizados nos cursos de graduação, pós-graduação e especialização da Odontologia”, diz o CROSP.
O Conselho informou ainda que busca informações sobre o profissional que atendeu Isadora e fez a extração do dente. “A partir dessa identificação, e mesmo sem denúncia formal, o CROSP acionará a Comissão de Ética e a Fiscalização para o devido acompanhamento do caso.”
Dor após a extração
Ao g1, Grasiela contou a jovem tirou dois dentes do siso no lado direito em março. Na época, foi informada que precisaria extrair o siso do lado esquerdo.
De acordo com a mãe, na primeira cirurgia, Isadora teve um inchaço normal, uma dor suportável e logo voltou a trabalhar. A segunda extração dos dois dentes do siso do lado esquerdo foi em em 19 de abril, em uma clínica odontológica de Porto Feliz. Após o procedimento, Isadora foi para casa fazer o repouso indicado pela dentista.
No dia 21 de abril, a menina disse aos pais que não tinha conseguido dormir, pois estava sentindo muita dor e com dificuldade até para respirar. Grasiela diz que, por causa da situação, buscou ajuda da profissional.
“Entramos em contato com a dentista, que aumentou os remédios pra dor e trocou o antibiótico. Disse que era normal, para aguardarmos o novo antibiótico fazer efeito. Ela não nos alertou a gravidade ou risco que a minha filha corria. Apenas nos tranquilizou.”
Ainda no dia 21, Isadora teve episódios de vômitos e foi levada pela família para o hospital. Segundo os pais, no dia seguinte, por volta das 11h, ela foi atendida por um especialista bucomaxilofacial, e passou por uma cirurgia para ser feita drenagem no local da extração. Durante a cirurgia, Isadora teve parada cardíaca que durou quase quatro minutos.
Depois da cirurgia, Isadora foi para a UTI, mas teve outra parada cardíaca e morreu às 6h15 do dia 23 de abril. Grasiela relembra que, após a morte da filha, a família foi questionada sobre os procedimentos pós-cirúrgicos e notou que os protocolos tinham diferenças.
“Cada pessoa, até mesmo quem era da área da saúde, dizia algo sobre os procedimentos. Pesquisamos e descobrimos que não existe um protocolo oficial, registrado em normativo, que oriente sobre o procedimento. Além disso, não é obrigatório que o profissional faça anamnese do paciente antes da cirurgia.”
Os pais procuraram o Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP) e relatam que foram informados que existem alguns protocolos e obrigatoriedades apenas para atender pacientes que possuem alguma comorbidade.
“A gente não é alertado para o risco da cirurgia. É um procedimento tratado como algo corriqueiro. Se houvesse alerta, orientações, as pessoas ficariam mais preocupadas e atentas aos sinais. Pediram exames antes da cirurgia para ver se estava tudo bem”, afirma Albanese Bellon, pai de Isadora.
De acordo com os pais, Isadora estava no terceiro semestre de psicologia e trabalhava com a mãe. Namorava há 4 anos e estava com planos de casar.
“Um dia a gente estava trabalhando, e ela me disse ‘mãe, eu tô no melhor momento da minha vida’”, lembra Grasiela.
Petição pública
Em 27 de junho, a família protocolou, junto ao CROSP, a petição exigindo que seja criado um protocolo único de atendimento, pré e pós-operatório. Pelas redes sociais, os pais divulgam o caso e pedem que mais pessoas assinem a petição. Mais informações sobre a petição estão nesse link.
Outras mortes
Na petição, a família cita dois casos recentes em que pessoas morreram dias após a extração do siso.
Um deles, é o caso da jovem de Leme (SP) que morreu uma semana depois da cirurgia. Marina Mesquita Silva chegou a ficar internada por três dias, mas não resistiu. O caso continua sendo investigado pela Polícia Civil.
O outro caso é do professor de dança, José Eliezio Oliveira Silva, que morreu em Fortaleza (CE) após infecção generalizada uma semana após extrair o dente do siso em um posto de saúde. As duas mortes ocorreram em maio deste ano.
Confira um trecho da petição:
“Os abaixo-assinados, brasileiros, devidamente identificados, solicitam a este Egrégio Conselho a criação de Grupo de Trabalho, com fulcro no artigo 19 do Regimento Interno das Câmaras Técnicas, para estudos voltados à viabilidade de elaboração de protocolos, diretrizes e parâmetros mínimos norteadores da atividade clínica afeta à identificação da necessidade e efetiva extração de terceiro molar.”
O que diz o CROSP
“O Conselho reforça que todos os protocolos da Odontologia são fundamentados na Ciência, preconizados na literatura odontológica e utilizados nos cursos de graduação, pós-graduação e especialização da Odontologia. Dito isso, o CROSP não tem, em suas atribuições, determinadas pela Lei 4118/64, a função de criar protocolos para procedimentos odontológicos. Ressaltamos, contudo, que por intermédio de denúncias, representações e constatações realizadas pela Fiscalização, o CROSP apura infrações à Lei Federal nº 5.081/66, que regula o exercício da Odontologia em território nacional, ao Código de Ética Odontológica, instituído pela Resolução CFO-118/2012, às Leis que regulamentam as categorias profissionais odontológicas e às demais normas regulamentadoras do Conselho Federal de Odontologia e às normas pertinentes. O CROSP, ao receber denúncias, adota providências para a devida e regular apuração dos fatos, notificando o responsável técnico e demais profissionais envolvidos, para fins de esclarecimentos.”
Fonte: G1 (Foto: Arquivo Pessoal)